Nos dias 5, 6 e 7 aconteceu o Arrocha o Nó, congresso de forró organizado por Alex Amorim, Islânia Lopes e Edson Nobre, e é sobre isso que gostaria de falar hoje.
A última edição do Arrocha o Nó aconteceu em 2019, nessa edição eu já havia me apaixonado pelo evento e em 2022 não tinha como ser diferente, embora o contexto agora seja completamente diferente. Para entender isso eu vou precisar trazer um relato extremamente pessoal para explicar a minha perspectiva emocional dentro do evento.
O que separa a edição de 2019 da de 2022 é a pandemia inteira. Para os que estão me lendo pela primeira vez, a pandemia foi muito cruel comigo. Eu perdi um tio que foi importantíssimo para minha formação como pessoa e exatamente um mês depois eu perdi meu pai. Ambos para a COVID. Escrevi uma série de textos sobre isso aqui no blog, se por um acaso alguém tiver interesse em ler é só clicar aqui. Logo em seguida aconteceram uma série de questões na minha família que deixaram a minha vida de ponta cabeça. Eu passei a ter uma outra vida depois desses eventos e eu ainda estou aprendendo a viver essa outra vida.
No primeiro dia do evento, na sexta feira, segui minha rotina normal de sexta, passo o dia no trabalho e saio um pouquinho mais cedo, pois faço terapia das 16 às 16:50. Naturalmente, saí da terapia já muito sensível, fui para casa da Jaiana, pois lá seria o meu local de apoio para o Arrocha o Nó, pois é bem mais perto do local do evento do que a minha casa. Tomei café com a Virgínia, minha sogrinha linda do meu coração, e logo em seguida fui descansar um pouco para aguentar a festa de abertura do evento.
Desde que o meu pai se foi, eu sou constantemente assombrado por um sentimento de incompletude. Mesmo nos meus momentos mais felizes e alegres de agora, eu sinto que eu não consigo mais ser feliz como antes. Enquanto estava deitado descansando, fui mais uma vez assombrado por isso. O sentimento que eu tinha guardado do Arrocha o Nó de 2019 era tão incrível, que eu senti que ir para o evento esse ano só serviria para mais uma vez ter a certeza de que nada será como antes. Fiquei das 17:30 até as 20hs deitado na cama paralisado, a noite chegou e eu não consegui sequer me levantar para acender a luz. Liguei para a Izabel Sousa. Chorando, angustiado e desesperado. Eu tinha me afundado tanto nos meus processos mentais que naquele momento eu só chorava, nem raciocinava mais. Falei que não conseguiria ir, não ia aguentar ir. Izabel conseguiu me acalmar e então parei de chorar. Depois falei com a Herbeline que colocou a ligação no viva voz e consegui falar com ela e o Lucas Matos ao mesmo tempo. Depois de muita conversa com os dois, consegui reunir forças, me arrumar e ir para o evento. (Izabel, Bela e Lucas, muito obrigado, eu devo muito a vocês).
Agora que consegui situar a carga emocional envolvida aqui, vamos finalmente ao evento em sí. O Arrocho o Nó acontece em um lugar chamado Na Taipa Polo Gastronômico, situado na Barra do Ceará, mas especificamente na Vila do Mar, próximo ao Marco Zero de Fortaleza. A entrada do local fica bem de frente para o calçadão da Vila do Mar que contorna a praia, um dos lugares mais lindos de Fortaleza, mas que infelizmente sofre muito com o estigma de ser um local perigoso e por consequência não recebe visitas de moradores de outros bairros. Na parte de trás do Na Taipa Polo Gastronômico tem um grande salão coberto por uma palhoça, onde acontecem as aulas do congresso e os bailes.
Na sexta feira a noite foi o baile de abertura do evento.
Durante a festa de abertura, houve uma mostra coreográfica que vou deixar aqui os registros feito pelo Dido Reis em seu canal:
Aqui a programação do sábado:
O Arrocha o nó inteiro para mim é uma coisa mágica, as aulas, os bailes, as pessoas, tudo. Na festa do sábado houve esse momento aqui que foi o puro creme da energia forrozeira:
E houve outro momento mágico na festa de sábado (mais um momento mágico no meio de um evento que é pura magia). A primeira banda a tocar no sábado foi o Zuu Cantor, figura conhecidíssima das festas de forró pé de serra de Fortaleza. Lá pelas tantas, o Zuu parou o show para dar um recado a plateia, ele apontou para o sanfoneiro, um senhor já de idade, e falou que o sonho dele quando criança era tocar com esse senhor e naquela noite ele estava realizando esse sonho. O sanfoneiro era ninguém mais ninguém menos que Otílio Moura, ex-integrante da banda Mastruz com Leite e criador dos acordes de várias músicas que são verdadeiros hinos do forró, incluindo os acordes da música Meu Vaqueiro Meu Peão. Quando o Zuu disse quem era o sanfoneiro, ele começou a tocar Meu Vaqueiro Meu Peão e o Zuu emendou “Vocês tão ouvindo o original, o criador”. Eu fiquei emocionado de verdade, eu lembro de já ter lido sobre o Otílio Moura pesquisando sobre a história do forró, e agora eu estava vendo ele tocando na minha frente, bem pertinho de mim.
É muito difícil explicar o que algumas músicas do forró representam para quem é forrozeiro. Zouk do Rubi, Meu Vaqueiro Meu Peão, Me Usa, Pétalas Neon, De Janeiro a Janeiro, Timidez, entre outras. Quando essas músicas começam a tocar, é muito mais do que uma música, é um chamado, um chamado para viver, abraçar a própria cultura, dançar e ser feliz. Quando eu escuto o toque da sanfona dessas músicas, eu sinto como se o sanfoneiro tivesse segurando o meu coração com as duas mãos e dedilhando os acordes direto no meu coração. Foi isso que senti quando vi Otílio Moura tocar bem na minha frente.
A programação de domingo foi essa:
A última aula do evento foi o Grupo Coco de Praia do Iguape, é inútil tentar descrever o poder desse momento, então vou apenas deixar aqui um vídeo:
Quando estávamos saindo da palhoça para ir para o calçadão onde o Grupo Coco ia se apresentar, senti mais uma vez o assombro das minhas angústias. O que acontece é que esse grupo também se apresentou em 2019 e naquela época essa apresentação me marcou profundamente. Indo novamente para essa mesma apresentação no mesmo local em 2022 me faz comparar o que minha vida era e o que é agora. De forma quase automática as forças das minhas pernas falham, a sensação de que nada vai ser tão bom quanto já foi um dia é inevitável. O nó na garganta quase arrebenta minha traqueia, mas deu certo. Naquele momento não caí, naquele momento não chorei, consegui seguir.
Na festa de encerramento no domingo, Eder Soares falou que a dança não é só diversão, não é só cultura, é manutenção da saúde mental e manutenção do espírito. Parecia que ele estava falando aquilo para mim. Ao Edson Nobre, Amsraiane Guilherme, Alex Amorim, Islania Lopes e todas as pessoas que me presentearam com um abraço, uma conversa e/ou uma dança, fica aqui o meu mais sincero e profundo obrigado. Não vou encerrar esse texto de forma otimista, dizendo que agora está tudo bem e estou feliz. Não adianta achar que uma “cura” virá de um evento, mas com certeza no Arrocha o Nó eu encontrei um alívio.
Não conhecia esse congresso de forró, me pareceu bem interessante. É sobre o local, confesso que sou louca pra conhecer essa área da Barra do Ceará, mas tenho medo também, mas depois do seu texto fiquei com mais coragem de tentar conhecer.
Adoro a sua escrita. Deixou um sorriso honesto a leitura desse texto.
Os pequenos passos também são passos dados e os pequenos alívios também são passinhos pra cura. Feliz de quem se permite. Parabéns